Depois de ter tomado uma das decisões mais controversas da Lava Jato – adivulgação dos grampos telefônicos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 16 de março, incluindo uma conversa dele com a presidenta Dilma Rousseff -, o juiz federal Sérgio Moro pediu desculpas pela “polêmica” causada. Em ofício enviado nesta terça-feira ao Supremo Tribunal Federal (STF), o magistrado, responsável pelos processos da operação na primeira instância em Curitiba, afirmou que “jamais” foi sua intenção “provocar tais efeitos”, em provável referência aos protestos contra o Governo engrossados após a divulgação dos áudios na TV. Mais à frente, Moro afirma que a retirada do sigilo dos grampos não teve como objetivo “gerar fato político-partidário, polêmicas ou conflitos”. Na peça, ele também admite que pode ter “se equivocado em seu entendimento jurídico” com relação à divulgação das conversas contendo autoridades com foro privilegiado. Moro isenta Dilma de qualquer intenção criminal, mas reafirma que as gravações deveriam vir a público pois mostram que Lula estava tentando obstruir a Justiça.
O documento de 31 páginas enviado nesta terça-feira é uma resposta ao pedido de informação feito pelo relator da Lava Jato no STF, Teori Zavascki. Dias após a divulgação dos grampos, o ministro Zavascki solicitou que toda a investigação contra Lula que corre na Justiça Federal do Paraná nas mãos de Moro fosse remetida para o Supremo. O ministro também criticou a divulgação de conversas envolvendo autoridades com foro privilegiado, como a presidenta Dilma e ministros. Além disso, ele usou seu despacho, em 23 de março, para criticar a decisão do juiz paranaense. “O que se infirma é a divulgação pública das conversas interceptadas da forma como ocorreu, imediata, sem levar em consideração que a prova sequer fora apropriada à sua única finalidade constitucional legítima, muito menos submetida a um contraditório mínimo”, criticou Zavascki. “Não há como conceber, portanto, a divulgação pública das conversações do modo como se operou, especialmente daquelas que sequer têm relação com o objeto da investigação criminal”. Uma das mais criticadas foi uma conversa entre a mulher de Lula, Marisa Letícia, e um dos filhos do casal.
Na conversa mais controversa (leia abaixo), registrada na véspera da posse do petista, a presidenta diz que irá enviar o termo de posse de ministro para que ele usasse “em caso de emergência”. Além das consequências políticas, a liberação dos áudios já teve efeitos legais. Foi citando as gravações que o ministro do STF Gilmar Mendes decidiu impedir que Lula tomasse posse como ministro da Casa Civil – o que lhe garantiria o direito de ser julgado apenas pelo Supremo. Mendes também acusa a presidenta de “fraude” pela nomeação. A decisão de Moro de levantar o sigilo das conversas também foi duramente criticada por juristas, que também atacaram a quebra de sigilo sobre conversas pessoais sem aparente ligação com as investigações, e também por ministros do Supremo. Além de Zavascki, Marco Aurelio de Mello também achou a liberação inadequada. Já Lula acusou Moro de querer destruir sua imagem, e o PT viu no gesto a prova da suposta partidarização da Lava Jato.
No documento enviado ao Supremo, Moro se defende da acusação de ter extrapolado suas atribuições ao divulgar os áudios da presidenta, já que ela tem foro privilegiado, dizendo que não há indícios de crime cometidos pela presidenta, mas apenas de Lula: “Apesar desse diálogo interceptado [entre Dilma e Lula] ser relevante na perspectiva jurídico-criminal para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já que indica o propósito de influenciar, intimidar ou obstruir a Justiça, no que se refere à excelentíssima presidente da República, não há qualquer manifestação dela assentindo com esse propósito”. Em outro trecho ele diz que o levantamento do sigilo foi feito para “prevenir novas condutas do ex-presidente para obstruir a Justiça, influenciar indevidamente magistrados ou intimidar os responsáveis pelos processos”.
No dia da divulgação, Moro afirmou, no despacho em que autorizava a divulgação dos áudios, que “o levantamento [do sigilo] propiciará (…) o saudável escrutínio público (…). A democracia em uma sociedade livre exige que governados saibam o que fazem governantes, mesmo quando estes buscam agir protegidos pelas sombras”. Ele se referia aos diálogos em que Lula conversava sobre maneiras de frear a força-tarefa da Lava Jato. No documento enviado nesta terça-feira ao Supremo, Moro afirma ainda que existe uma “quantidade bem maior de diálogos interceptados” que não foram tornados públicos. Este material será enviado ao STF “em mãos e com as cautelas devidas”.
De acordo com a decisão de Zavascki, o plenário do Supremo deve decidir quais áudios devem motivar eventual abertura de investigação no Supremo e quais deles devem voltar para as mãos de Moro em Curitiba. Não há data para essa análise.
Fonte: http://brasil.elpais.com